quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Três meses...., por vovô Edilberto

É custoso crer, mas já se passaram noventa longos dias desde que o Lucca nos deixou, levando consigo as coordenadas que nos indicassem como agir a partir daquele fatídico 19 de agosto.

Nós, que desde o início não conseguíamos esconder a insegurança que a sua doença nos impunha, fomos assistindo no decorrer dos dias, aquele garoto mostrar-nos a sua garra e a sua vontade de viver, com o otimismo de que tudo daria certo e que os resultados indesejados, seriam obrigados a ceder lugar às vitórias conseguidas através da determinação e coragem daquela criança.

Os dias se passavam céleres e, ele insistia em nos fazer acreditar que a batalha contra aquela malfadada Adrenoleucodistrofia já estava quase totalmente vencida, e que era só questão de alguns dias a mais, para sairmos daquele hospital sombrio e retornar às brincadeiras inocentes na nossa casa. E, quando conversávamos sobre esse dia, seus olhinhos ganhavam um brilho diferente – uma empolgação feliz da expectativa de quando isso acontecesse e tudo finalmente voltasse ao normal.

Afinal, a parte mais difícil parecia ter sido superada - a "pega" da nova medula! Agora era esperar que ela se reproduzisse no nosso Lucca e o reconhecesse definitivamente como seu novo proprietário! Quando isso acontecesse em quantidades compatíveis com o seu tamanho, peso e idade, nada mais haveria de nos apoquentar. Ele voltaria a ser aquela criança feliz, alegre e estudiosa que encaminhamos àquele hospital, para receber a medula totalmente sadia da garota americana...

E tudo caminhava bem! Tudo fluía com as dificuldades inerentes a um procedimento daquela natureza, mas oferecendo-nos perspectivas otimistas e felizes.
Não me deterei aqui discorrendo sobre os motivos e a época em que as coisas começaram a se desarranjar, já que isso foi comentado longamente nas minhas crônicas anteriores, embora aquela dúvida atroz das responsabilidades que levaram a esse desfecho inesperado, ainda nos atormente.

A época do final de ano convida-nos à reflexão das coisas que fizemos ou mesmo das que deixamos de fazer neste 2009, que já prepara o seu aceno de despedida. E são os quadros carregados em cores que se sobressaem aos mais amenos. O resultado do balanço de lucros e perdas que vislumbramos em 2009, não foi dos melhores. Parece que Deus quis testar-nos e à nossa fé, arrancando-nos dos braços esse menino que certamente deve ter vindo com a missão especial de reorganizar a nossa família, embora a preço tão extorsivo!

Como será o nosso Natal? E o nosso cruzar as barreiras de 2010? Haverá porventura em nossos corações o espírito festivo que enche de risos e lâmpadas multicores as residências nessa época de comemorações? E o que temos a comemorar se nos nossos ouvidos persiste a antiga música de triste refrão: "Naquela mesa tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim"?
Pois é, nada há o que festejar, se a manjedoura do nosso presépio está vazia! O Natal estará incompleto! Não seria justo comemorar a falta que sentimos! O conteúdo das nossas taças de brinde serão as lágrimas de sabor amargo que derramamos desde 19 de agosto – quando nossas maiores esperanças se desvaneceram.

Quem sabe no ano que vem... Temos consciência de que essa saudade que ele deixou jamais será resolvida. Mas, talvez até lá as feridas estejam mais cicatrizadas, ou, pelo menos, o tempo as tenha tornado mais amenas. Serão as cinzas abafando as chamas e impedindo-as de crepitar.
Só esperamos sinceramente que ele possa estar bem! Que ele tenha se livrado daqueles cateteres e que possa estar correndo e jogando bola nos imensos gramados celestes, como atleta do time dos anjinhos que vivem fazendo folia para alegrar ao Criador. Parece-me ainda ouvir os seus gritinhos felizes de quando brincávamos juntos! Eram arroubos de uma criança que deseja mostrar que está despreocupada, exatamente por entender que se sente amada e sabe que pode contar com a proteção daqueles que lhe são queridos!

Tomara ele esteja tendo essa mesma segurança agora e, naquelas vastidões etéreas continue percebendo quanta ternura ainda restou nos nossos corações para protegê-lo e orientar-lhe os passos, sob a forma singela de muitas preces. Oxalá, um dia nos reunamos de novo e, entre abraços felizes, Lucca consiga nos explicar o que Deus havia escrito nas entrelinhas desse capítulo das nossas vidas. Até lá, teremos de aprender a conviver com essas incertezas que nos oprimem e com essa saudade terrível.

Beijo

Com Amor,

Vovô.

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